O Brasil disputou, neste sábado, 20 , na cidade de Celje, na Eslovênia, uma partida que foi histórica para o tênis de mesa paralímpico nacional. Pela primeira vez um representante do país jogou uma final de um Campeonato Mundial na modalidade e a paulista Catia Oliveira, 27 anos, foi a protagonista da façanha.
Após vencer nas quartas de final a russa Nadejda Pushpasheva, número 3 do mundo na classe 02, para atletas cadeirantes com baixa mobilidade, e derrotar na semifinal a italiana Giada Rossi, número 2 do ranking, Catia chegou à final para um reencontro com a coreana Su Yeon Seo.
Número 1 do mundo, a rival, de 32 anos, prata em simples e bronze por equipes no Rio 2016 e dona três medalhas em Mundiais (prata em simples em 2014 e bronze por equipes em 2013 e 2014), já havia enfrentado a brasileira na primeira partida pela fase de grupos, na quarta-feira (17.10), que terminou com vitória por 3 x 1 para a coreana. Na final na Eslovênia, Su Yeon Seo venceu por 3 x 0.
A decisão começou com a rival impondo um ritmo muito forte no primeiro set e não permitindo nenhum tempo de jogo para Catia Oliveira. O resultado foi um placar elástico, de 11/3.
A partir daí, o jogo ficou muito equilibrado. Catia passou a atuar com mais consistência na segunda parcial e o duelo chegou ao 10/10 depois de Catia salvar um set point e com o placar podendo pender para qualquer um dos lados. Su Yeon Seo, entretanto, venceu o ponto seguinte e fechou o set por 12/10.
Na última etapa, a brasileira teve duas oportunidades para ganhar o set, no 10/9 e 11/10, mas Su Yeon Seo conseguiu o empate e, depois do segundo set point defendido, fechou a partida em 13/11.
Com a medalha de prata conquistada na Eslovênia, Catia Oliveira superou a campanha de Bruna Alexandre no Mundial de 2014, em Pequim, quando a jogadora da classe 10, para jogadores com deficiências motoras leves ou amputação de membros superiores, ficou com o bronze no individual, até então a única medalha no individual conquistada pelo Brasil em Campeonatos Mundiais.
“Estou chateada, é claro, porque ninguém gosta de perder”, lamentou Catia. “Mas não entrei muito bem no jogo. Não consegui fazer direito a minha estratégia, fiquei um pouco mais nervosa do que ontem, mas acho que é normal, porque era uma final de um Mundial. Ela é a número 1 do mundo, é muito experiente e muito forte, tanto tecnicamente quanto fisicamente”, prosseguiu a mesatenista.
“Queria mais uma vez agradecer primeiro a Deus por eu estar viva e com saúde, e, depois, à minha família, ao pessoal da seleção brasileira, a todos da minha equipe em Bauru, à Tainá, que cuida de tudo na minha carreira, e ao Adilson, meu técnico em Bauru, e ao Paulo Molitor (coordenador-técnico da seleção no Mundial da Eslovênia, que acompanhou Cátia nas partidas)”, enumerou a jogadora. A cerimônia de entrega das medalhas só será realizada na noite deste sábado em Celje.
Emoção 11 anos após a tragédia
Mais do que um resultado muito expressivo para seu currículo no tênis de mesa, a medalha de prata no Mundial da Eslovênia é uma recompensa para uma atleta que se viu obrigada a reinventar sua vida e seus sonhos após sofrer um terrível revés em 2007.
No dia 15 de outubro de daquele ano, Catia de Oliveira, nascida em Cerqueira César, no interior de São Paulo, voltava de carro com duas amigas retornando de Piracicaba em direção a Bauru quando um acidente transformou sua vida.
O carro onde ela estava se chocou contra a traseira de um outro veículo. Catia dormia no banco traseiro sem cinto de segurança e, com o impacto, sofreu uma lesão medular cervical que a tirou os movimentos das pernas.
Antes do acidente, Catia, que tinha 17 anos à época, jogava futebol. E no dia da tragédia, ela realizou o maior sonho de sua vida, que acabou não podendo ser concretizado pela lesão na coluna.
“Foi um acidente leve. Minhas amigas estavam com cinco e só ficaram com a marca do cinto. O carro bateu por volta das 11h e nem bateu com força. Mas como eu estava deitada e sem o cinto, deu uma chicotada na minha coluna e pronto. Cinco minutos antes da batida eu estava acordada. Eu deitei e nós batemos. Tinha que ser…”, recorda.
“Eu estava no hospital quando, às 17h, saiu a minha convocação para a Seleção Brasileira. Eu iria disputar o Mundial Sub-17 no Chile. Era meu maior sonho e para mim aquilo tudo foi difícil demais. Mas eu superei e hoje estou aqui, vivendo essa emoção e conquistando uma medalha em um Mundial”, diz Catia, que começou a praticar tênis de mesa em 2013, seis anos depois do acidente.
Evolução em diversas classes
Coordenador-técnico das seleções masculina e feminina no Mundial da Eslovênia, Paulo Molitor fez uma avaliação do desempenho do Brasil em Celje. Para ele, a medalha de prata de Catia e o desempenho do time, no geral, são indicativos de que a modalidade caminha para uma bela campanha nas Paralimpíadas de Tóquio 2020.
“Nós tivemos uma prata com a Catia, mas chegamos com vários atletas às quartas de final, que com mais uma vitória já teriam chegado ao pódio”, ressaltou Molitor, referindo-se ao desempenho de Bruna Alexandre (classe 10), de Danielle Rauen e Jennyfer Parinos (classe 09) e Paulo Salmin (classe 07), que avançaram às quartas de final na Eslovênia.
“Esse é um momento muito importante para o tênis de mesa brasileiro. Todos os nossos jogadores estiveram tecnicamente muito fortes. Jogamos de igual para igual com os melhores do mundo e a tendência é que para Tóquio possamos ter um desempenho ainda melhor do que o que tivemos no Rio”, projeta o treinador.
No Rio 2016, o Brasil faturou quatro medalhas. No feminino, Bruna Alexandre ficou com o bronze na classe 10 individual feminino e o país faturou o bronze por equipes na classe 6-10, com Bruna Alexandre, Danielle Rauen e Jennyfer Parinos. No masculino, Israel Stroh foi prata no individual na classe 07 e Iranildo Espíndola, Guilherme Costa e Aloísio Lima ficaram com o bronze por equipes na classe 1 e 2.
“Se fizermos uma análise de nosso retrospecto nos últimos anos, vamos notar uma coisa muito bacana: no Mundial de 2014 (em Pequim), ganhamos o bronze com a Bruna Alexandre, na classe 10, o bronze por equipes no feminino da classe 8-10 (com Bruna Alexandre, Jennyfer Parinos e Jane Rodrigues) e o bronze no masculino da classe 1, com Aloísio Lima e Bruno Braga. Em 2016, foram quatro medalhas nas Paralimpíadas e, em 2017, no Mundial (em Bratislava), ganhamos um ouro por equipes (com Bruna Alexandre, Jennyfer Parinos e Danielle Rauen)”, lembra Molitor.
“O Brasil está conseguindo chegar ao pódio em várias classes. O patamar do tênis de mesa paralímpico está melhorando a cada grande competição e nosso leque de opções de pódio está se ampliando em várias classes e isso é muito bom. Estamos no caminho certo”, comemora o treinador.
Pesar
Infelizmente, Cátia Alves teve uma notícia triste após a conquista da medalha. Emocionado com a chegada da filha à final do Mundial Individual, o pai dela, Flávio Alves, passou mal na noite de sexta-feira e foi internado em um hospital de Cerqueira César, em São Paulo. Neste sábado, 20, ele não resistiu e faleceu. O Comitê Paralímpico Brasileiro lamenta profundamente e se solidariza com a mesa-tenista e a família neste momento de imensurável tristeza.
Time São Paulo
Os atletas Bruna Alexandre, Catia Oliveira, Danielle Rauen, Israel Stroh, Jennyfer Parinos e Paulo Salmin são integrantes do Time São Paulo, parceria entre o CPB e a Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência de São Paulo que beneficia 62 atletas e seis atletas-guia de dez modalidades.
Assessoria de Comunicação do Comitê Paralímpico Brasileiro (imp@cpb.org.br)