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Craques do goalball mostram que força vai muito além dos arremessos

Carol Duarte e Victória Amorim durante partida dos Jogos Parapan-Americanos de Lima 2019 | Foto: Daniel Zappe / EXEMPLUS / CPB

Ana Carolina Duarte Ruas Custódio, 33 anos, e Victória Amorim do Nascimento, 23, possuem muito mais afinidades do que terem nascido no mesmo estado do Rio de Janeiro e defenderem a Seleção Brasileira de goalball. Apesar dos dez anos de que separam duas das principais atletas da equipe, a vida de cada uma, de certa forma, traçou destinos semelhantes. Para o bem e para o mal.

Mas este texto não pretende focar nas tristezas, muito pelo contrário. Em data tão significativa, a ideia é que sirva de exemplo e leve tantas outras mulheres a se identificarem com as dores e os amores de pessoas reais, de carne e osso, cuja potência não aparece apenas nos arremessos em quadra. Pois foi justamente fora dela onde tiveram de ser mais fortes.

Bom, o primeiro traço que une a dupla é a precocidade de um fato que mudaria para sempre suas realidades. Ambas tinham 11 anos quando acordaram de cirurgias sem que pudessem mais enxergar como antes. A partir desse ponto, vamos separar as histórias para que você as conheça melhor.
 

Carol: novos passos da bailarina

Foto colorida de Ana Carolina na quadra de goalball. Ela está de pé na frente do gol. Carol está de costa olhando para baixo e segura a bola sobre a cabeça se preparando para fazer um arremesso. Ela veste o uniforme amarelo da Seleção e seu cabelo loiro está preso.

Para quem nasceu em Madureira, um dos berços do samba carioca, dançar era quase uma redundância. Por isso, desde cedo, a música atraiu Ana Carolina às aulas de balé, jazz, sapateado e o que mais aparecesse em seu caminho. O sonho de ser bailarina, porém, foi encerrado quando fortes dores de cabeça levaram sua mãe, Ana Maria, a buscar ajuda médica. “Os médicos tratavam como sinusite”, conta Carol.

O resultado de uma tomografia, no entanto, mostrou que a sinusite era, na verdade, um tumor do tamanho de um caroço de abacate na cabeça da jovem. Apesar de benigno, ele precisou ser extraído. No dia 21 de maio de 1999, Carol enfrentou 14 horas de uma cirurgia muito delicada: “Os médicos chamaram meus pais e disseram que eu tinha chance mínima de vida e, caso sobrevivesse, ficaria com sequelas muito graves. Quando acordei da cirurgia, não tinha ninguém perto de mim. Estava bastante grogue e não percebi que havia perdido a visão”.

Os primeiros passos sem enxergar foram cada vez mais agarrados à saia da mãe. A jovem bailarina se tornou uma pessoa retraída, com medo de tudo. “Sempre fui manhosa, mimada pela minha mãe. Depois que perdi a visão, ela era os meus olhos, um pedaço de mim.”

As aulas de balé, ela ainda tentou frequentar para estar próxima das amigas. Desistiu. Uma outra semente começara a ser plantada no Instituto Benjamim Constant, referência no país na área da deficiência visual. “Quando conheci o esporte, não sei se preencheu a lacuna da dança, mas me fez gostar de outra modalidade, que foi o goalball. Passei pela natação, pelo remo, mas foi no goalball onde me encontrei como atleta”, relata.
 

Saudade e fibra para se reconstruir

No fim de 2002, Carol perdeu seu maior alicerce. Um mal súbito no coração logo após a família se reunir para montar a árvore de Natal levou Ana Maria para longe da filha de 15 anos. “Ali, eu percebi que tinha perdido meu anjo da guarda”, diz a atleta.

O vazio, ela teve de preencher com a própria necessidade de se reerguer. Para isso, o esporte se tornou elemento fundamental. Dois anos após a morte da mãe, veio a convocação para defender o Brasil nos Jogos de Atenas, em 2004 – a primeira participação do goalball brasileiro em Paralimpíadas, motivo de orgulho até hoje: “Foi o goalball feminino que alavancou o Brasil no cenário internacional”, ressalta.

O papel de líder – é a mais experiente da Seleção –, por sinal, ajudou a moldar sua consciência em relação ao que datas como a de hoje simbolizam: “Dizem que a mulher é o sexo mais frágil. Será? Com tantas atribuições, será mesmo que somos o sexo mais frágil? Penso que não. Pra mim, ser mulher é poder me superar cada dia mais e ser capaz de ter orgulho do que sou. Ser mulher e cega é uma luta constante contra os estereótipos que a sociedade nos impõe”, define a jogadora. “Ser mulher também é receber críticas, ser rejeitada ou menosprezada apenas pelo meu gênero. Tudo isso só me faz querer ser mais forte e encorajada para dizer, com honra, que eu sou mulher, atleta e tenho deficiência visual!”.

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Victoria: mãe e atleta antes dos 20

Foto colorida da Victória jogando goalball. Ela está deitada e defende um arremesso. A bola azul parou nas pernas dela. Vic está com os cabelos pretos e presos, veste o uniforme azul da Seleção e usa a viseira obrigatória no goalball

Como ela mesma diz, foi “premiada”. A Síndrome de Miller Fisher, doença que provocou a atrofia do seu nervo óptico e, consequentemente, a perda da visão ainda criança, afeta anualmente uma em um milhão de pessoas. Em Itaguaí, município a cerca de 70 km da capital do Rio, a pequena que já havia sonhado em ser de empregada doméstica, pois se orgulhava da tia que trabalhava em várias casas, a veterinária, dado o amor pelos bichos, demorou a entender que o quadro era irreversível.

“Achava que, se passassem dez, 15 dias, eu voltaria a enxergar. E foram se passando dois, três meses, e nada. Quando deu seis meses, tive de retornar ao hospital. Foi quando ouvi uma conversa da minha mãe com uma outra mãe falando que o médico havia dito que eu jamais voltaria a enxergar. Ali, sim, foi um baque”, relembra.

Para se adaptar, acabou indo estudar no Benjamin Constant. Foi lá onde Victoria conheceu o goalball, em 2010. Porém, não se engane. O amor pela bola azul demorou a engatar. “De cara, não gostei. Você acha que eu ia ficar me arrastando pelo chão e levando bolada? Mas continuei, tinha minhas amigas. Dei outra chance em 2011”, conta.

O que passou a mexer com a cabeça da jovem de 14 anos foi a velocidade com a qual a modalidade transformava sua vida. Aos poucos, ela entendeu que os gols marcados em profusão poderiam virar também seu sustento. “De uma menina que não tinha tênis para jogar e dependia de doação, eu comecei a comprar meus próprios tênis. Isso foi uma grande conquista. E acabou mudando minha vida de uma forma surreal, em todos os aspectos. Foi um gatilho muito importante para superar a perda da visão e me tornar a mulher que sou hoje.”

Mas é claro que nada viria tão fácil. Como tudo em sua vida, outro acontecimento precoce abalou as estruturas.
 

Menino ou menina?

Nos Jogos Paralímpicos do Rio, em 2016, Victoria já era uma estrela em ascensão na Seleção Brasileira. Porém, a derrota por 3 a 2 para os EUA na disputa pelo bronze no quintal de sua casa mexeu demais com o emocional: “Estava sofrendo muito com a depressão e não admitia nem deixava que falassem nada. Após a derrota no Rio, eu me cobrei demais, achei que tinha responsabilidade e fiquei muito mal. Quando pensei em engravidar, foi para suprir uma dor que era muito grande. Achei que, tendo um filho, voltaria a ser feliz outra vez”.

Entre a teoria e a prática, no entanto, há uma distância que a própria Vic desconhecia. Quando soube da gravidez, aos 19 anos, levou um choque. “Como eu cuidaria de uma criança? Não sabia nem cuidar de mim mesma”, conta. Com o pequeno Victor – que completa 3 anos no fim deste mês – nos braços, ela logo percebeu que a maternidade e a carreira como atleta precisariam entrar num acordo, afinal, uma coisa dependia da outra.

“Durante a gravidez e mesmo no pós-parto, eu pensei em desistir várias vezes. Até hoje penso, porque quero acompanhar o crescimento do meu filho, estar com ele o tempo todo. Mas não é possível. Dependo do esporte financeiramente para cuidar dele. Quando voltei para a Seleção, estava animada, mas, ao mesmo tempo, dilacerada por dentro por saber que eu deixaria meu filho com menos de seis meses de idade para poder jogar”, diz, sobre o retorno à equipe, em 2018.

Hoje, ela concilia a dupla jornada com a ajuda da família, que se mudou do Rio para Suzano, sede do Sesi-SP, clube defendido pela ala de 23 anos. E espera que datas como a deste 8 de março esclareçam melhor o papel da mulher na sociedade: “O mais difícil em ser mulher e deficiente visual é a aceitação das pessoas, é elas te verem realmente como uma mulher, como uma mãe que pode fazer as coisas. O meu recado, então, é esse: que a gente pode, sim, que a gente consegue, sim!”. Alguém duvida?

*Com informações da Confederação Brasileira de Desportos de Deficientes Visuais (CBDV)

Assessoria de Comunicação do Comitê Paralímpico Brasileiro (imp@cpb.org.br)

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