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Além dos ouvidos: conheça três iniciativas de música inclusiva

Luiza Caspary foi uma das atrações artísticas do Prêmio Paralímpicos 2019. Foto: Daniel Zappe/Exemplus/CPB

A música tem sido um importante veículo de aproximação de pautas importantes para a sociedade, como a inclusão de pessoas com deficiência. Diversos artistas brasileiros são prova disso e têm investido na acessibilidade musical nas canções e conteúdos que produzem. São novas formas de trabalhar a comunicação com o público. Com atitude e leveza, eles levam à sério a responsabilidade de pensar na música como importante ferramenta de comunicação universal. 

Para a cantora Luiza Caspary, a música inclusiva é “incluir todos na mente na hora de pensar em qualquer lançamento de conteúdo, seja foto, disco, vídeo. É furar a bolha e lembrar que existem diversas maneiras de comunicação. É ter interesse no outro e fazer o trabalho chegar, tendo isso como prioridade e não algo secundário”, diz. 

Luiza começou a investir em acessibilidade no seu trabalho em 2011, quando sua mãe, Marcia Caspary, estava fazendo um curso de audiodescrição. “Formou-se um grupo de estudos que se disponibilizou a acessibilizar o videoclipe chamado ‘O Caminho Certo’ e, assim, lançamos o primeiro videoclipe com audiodescrição do Brasil”, conta. 

A cantora Amanda Mittz se conectou com as possibilidades da música inclusiva em 2018. Ela acredita que música é para todas as pessoas, sem distinção. “Se torno o meu clipe acessível, se tenho Libras nos meus shows e nos meus vídeos, além de fazer com que pessoas com deficiência se sintam acolhidas, vistas, incluídas, eu tenho uma chance maior de alcançar mais pessoas com o que eu faço. Para nós, artistas, quanto mais pessoas ouvirem a nossa música melhor. Tornar a minha música acessível é um investimento que eu faço no meu trabalho e na minha comunicação com as pessoas”, detalha. 

O rosto de Amanda está espelhado 4 vezes em espelhos triângulos, ela é uma mulher branca de cabelos escuros, usa sombra azulada nos olhos e batom roxo nos lábios cerrados.
Foto: arquivo pessoal

Mittz, que tem visão monocular, conta que despertou para esse assunto durante um processo de recuperação da cirurgia em que ficou meses sem enxergar direito. “Foi aí que eu percebi o quanto era dependente da visão e o quanto a música não era inclusiva. E há muito anos eu buscava um mote para o meu trabalho. Eu sou cantora desde criança. Tudo fez sentido pra mim quando entendi que a minha missão como artista era falar sobre acessibilidade, trazer acessibilidade para o meu trabalho e mostrar para as pessoas que isso era garantia de um direito humano.” 

Acessibilidade no dia a dia e representatividade  

No processo de ir além do próprio som, esses artistas incluem recursos de acessibilidade (audiodescrição, Libras, legendas, descrição de imagens) em videoclipes, nas redes sociais, em shows online e presenciais e em tudo o que representa seu próprio trabalho. É uma construção constante. “Penso nisso todo o dia, desde que iniciei esse foco em me comunicar com todos. Tudo o que posto tem sempre esse cuidado. Tenho pessoas com deficiência na equipe para darem a consultoria final”, diz Luiza.  

Caspary traz alguns exemplos práticos disso. “Tudo que postamos hoje é conteúdo. Descrever as fotos com a hashtag #PraCegoVer ou #PraTodoMundoVer é muito importante, descrever os vídeos no YouTube mesmo que por texto na descrição do material. Incluir legendas sempre! Em stories, vídeos, tudo! Esse é um recurso disponível e todos nós podemos fazer. Quando o assunto é libras e audiodescrição, é necessário contar com profissionais da área, formados e capacitados para isso. Isso porque são traduções intersemióticas e necessitam muito conhecimento”, afirma. Confira aqui o videoclipe da música “Bem-vindo”, com Luiza Caspary e Jair Oliveira.

Tal como Luiza, Amanda vai além desses recursos de acessibilidade. Ela pensa na acessibilidade não só como alcançar as pessoas, mas como linguagem.  “Eu penso em camadas musicais. Um dos motivos do meu trabalho ter elementos de música eletrônica é porque, por meio dela, consigo ter alguns recursos de mixagem que dão mais profundidade ao som, e a pessoa que não enxerga consegue ter uma percepção melhor da minha música”. 

Isso se apresenta também na busca dela por pesquisar tecnologias assistivas e em caminhos de transformar esses estudos em arte. Amanda cita uma novidade que envolve outros elementos – mais um exemplo de pensar em música inclusiva – que terá um show de lançamento do seu álbum “Acesso”, em São Paulo, ainda sem data prevista. “Ele terá todos os recursos que citei, entre outras coisas. Vai ser uma imersão de acessibilidade, de sensações, de exploração dos sentidos e da percepção do que é um artista com deficiência”.  

Outro ponto na busca de um trabalho musical inclusivo é a representatividade. Mittz destaca a importância disso e conta com profissionais com deficiência na equipe também. “Eu, por ser uma pessoa com deficiência, é o meu lugar de fala, mas ao mesmo tempo, precisamos de mais representatividade. Quanto mais, melhor. Catharine Moreira é uma artista incrível, surda, que faz Libras dance no meu show e faz parte da banda. Ela canta comigo, mas com o corpo. Também conto com Carol Pacheco, uma das minhas produtoras executivas, que também tem deficiência e traz muito conhecimento.”

Segundo Amanda, estar em contato com outras pessoas com deficiência enriquece a canção dela e o seu discurso. “Eu crio e me empodero mais convivendo com essas mulheres incríveis e tendo mais amigos com deficiência. Quanto mais pessoas com deficiência eu conheço, melhor eu me sinto e me preparo também. E isso torna a minha música mais inclusiva porque tem bastante representatividade”, diz. Confira aqui o videoclipe “Igual a mim” da Amanda, com recursos de acessibilidade.

O poder de transformação da música 

Amanda lembra o papel do artista de destacar e aproximar pautas importantes na sociedade, como a inclusão de pessoas com deficiência. “Temos o papel de sacudir as ideias conservadoras, retrógradas e modificar essa ideia de que pessoa com deficiência não tem um lugar na sociedade, porque ela tem. Quando você faz música inclusiva, com acessibilidade, você não está fazendo uma boa ação. Você está garantindo um direito humano, porque o acesso à arte é um direito de todos. Isso deveria ser um ponto para levar outros artistas a fazerem música acessível”, enfatiza. 

Sobre esse poder de comunicação da música, Caspary conta sobre visibilidade também. “A música ultrapassa as barreiras do intelecto! É um jeito carinhoso de lembrar que grande parte da população é invisibilizada e dizer: ‘Eu te vejo. Faço trabalhos pensando em você’. Depois que tive Karina, percussionista surda de Recife, tocando comigo em dois shows, incluindo o Prêmio Paralímpico Brasileiro de 2019, me emociona mais ainda trazer as pessoas com deficiência comigo em cima do palco!”

Engajamento de artistas 

De acordo com Luiza, uma forma de inspirar outros artistas a fazerem música inclusiva é continuar fazendo o que tem feito. “Sinto que cada vez mais amigos artistas se sensibilizam e me chamam para consultorias. É algo que tem que vir de dentro, ser verdadeiro do artista/produtor de conteúdo”. 

O brasiliense Leo Fressato é outro artista engajado em fazer música com acessibilidade. Recentemente, ele lançou o álbum Louco e Divertido, que teve as 10 faixas divulgadas nas plataformas digitais e também no YouTube – com lyric videos em que as letras surgem na tela com interpretação em Libras. Nesse trabalho, ele buscou fazer música também com as mãos, como uma conexão com pessoas com deficiência auditiva. Confira aqui o video lyric da música “Louco e Divertido”. 

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